segunda-feira, 5 de julho de 2010

Periodização para tótós

Periodização, esse bicho de sete cabeças que assusta tanta gente! Na verdade, apesar de existirem de facto esquemas bastante complicados, no geral a periodização até pode ser bastante simples, principalmente para a maioria de nós, que não somos atletas de elite.

Então, mas primeiro que tudo, o que é isso de periodização? Muito basicamente, é o planeamento a longo termo do treino físico, de modo a alcançar vários objectivos. Esse planeamento utiliza blocos de tempo, chamados ciclos, que tanto podem ser microciclos, macrociclos ou mesociclos. Uma das vantagens da periodização é a evolução de diferentes características físicas. Isso já acontece naturalmente, em todos os ginásios, onde o pessoal da musculação divide o ano em bulk (ganhar bastante peso) e cut, ou seca (a perda  da banha toda que ganharam durante o bulk). Isso só por si já é um exemplo básico de periodização, mesmo que muito rudimentar. Outros atletas, com maiores requisitos físicos, precisam de dividir os seus treinos conforme os atributos exigidos. Podem, por exemplo, ter um plano de treino com o objectivo de aumentar a força máxima, outro para a força explosiva, outra para endurance, e ainda outro para aperfeiçoamento técnico.

Existem depois vários modelos de periodização, uma espécie de templates, segundo os  quais cada atleta ou treinador pode desenhar os seus ciclos. Dois dos modelos mais conhecidos são o modelo linear, onde um determinado objectivo é trabalhado desde uma fase introdutória até uma fase de pique (peaking), e o modelo conjugado, onde vários piques são alcançados de uma forma mais rotativa.

Outra das vantagens da periodização é o progresso constante dos atributos escolhidos, através da "ondulação" dos treinos. Todos sabemos que o objectivo de treinar é ser sempre capaz de efectuar cada vez mais trabalho, seja ele através de um aumento da intensidade, do volume ou da densidade. Essa evolução vem bastante facilmente no início, uma vez que são apenas os primeiros passos daquilo que o nosso corpo consegue fazer. Contudo, com o passar do tempo, e conforme o praticante vai se tornando cada vez mais avançado, as simples premissas de "fazer mais uma rep em cada set" ou "pôr mais 1 kilo em cada lado da barra" deixam de funcionar. O corpo adapta-se ao stress do treino e pára de evoluir. É nessa  fase que, quem não compreende os princípios da periodização, mete os pés pelas mãos.

Uns, limitam-se a repetir o mesmo treino vezes sem conta, sem perceber que não estão a alcançar nada desse forma. Outros, aborrecidos pela falta de progresso com os seus exercícios, resolvem mudar a estrutura do seu treino completamente. Isso faz com evoluam novamente, ou pelo menos é isso que parece à primeira vista. Na verdade, essa evolução deve-se uma vez mais ao facto de o corpo estar a aprender novos movimentos, novas exigências, tal como nas primeiras semanas/meses de treino. Contudo essa evolução significa muito pouco em termos de evolução geral. Se, por exemplo, começaram a treinar com o bench press, e depois de "enpancar" passaram para o dip, e depois para flexões com peso (tudo exercícios bastante similares, que trabalham os mesmos grupos musculares da mesma forma), o mais certo é que, ao voltarem ao bench press, estejam ainda nas redondezas do mesmo peso que usavam anteriormente. Ou seja, o suposto progresso de outros exercícios resultou em pouco ou nenhum progresso específico. Se voltarem ao dip e às flexões, verão que também aí não continuam a evoluir. Essa falta de evolução é mais acentuada quanto mais experientes e avançados voçês forem.

Tudo isto deve-se à dualidade entre as regras da acomodação e da especificidade. A regra da acomodação dita, tal como referi acima, que o nosso corpo adapta-se ao stress imposto e deixa de evoluir nessa direcção. A lei da especificidade (SAID - Specific Adaptation to Imposed Demand) dita que o corpo evolui especificamente naquilo que é treinado. Por outras palavras, se querem ser bons numa determinada actividade, têm que praticar essa actividade. Outras actividades parecidas apenas contribuem levemente para a evolução da actividade principal, sendo que essa margem é quanto mais pequena quanto mais avançado é o atleta.

Então, como evoluir numa actividade (neste caso, o bench pres) sem estagnar nem mudar para outras actividades? Através do uso da periodização, que vai alterando certos parâmetros do treino, sem no entanto mudar os parâmetros principais. Como costuma dizer Pavel Tsatsouline "same but different". Modificações na intensidade, na densidade e no volume permitem que o bench press seja praticado constantemente, mantendo uma certa progressão. Essa progressão, naturalmente, é também maior ou mais pequena dependendo da experiência de praticante. Enquanto um principiante aumenta 50 kilos sem grande problemas num ano, um campeão luta o ano inteiro para aumentar mais 5 kilos à sua já enorme carga.

A progressão clássica de um plano de periodização linear, como mostra o gráfico acima, é uma descida constante no volume juntamente com uma subida na intensidade, conforme criada por Matveyev. Isso baseia-se no facto de não ser possível manter um esforço muito elevado por um longo período de tempo. "You can't sprint a marathon" costuma-se dizer. O modelo conjugado funciona melhor para atletas bastante avançados, logo não entrarei em pormenores sobre ele. Contudo aconselho a todos a familiarizarem-se com o conceito de periodização. O livro "Power to the People"  é uma excelente fonte de informação sobre as bases da periodização, sem complicar em demasia, mais uma  vez do autor Pavel Tsatsouline. Nas suas palvras, "power to you!"

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